NA INCUBADORA COM... LUÍSA CORREIA
Na incubadora com... | 08-03-2024
Na sétima edição de "Na Incubadora com..." convidámos a Diretora Geral do Centro Tecnológico do Calçado de Portugal, Luísa Correia, para partilhar um pouco sobre o CTCP e sua relação com a SANJOTEC, e os desafios no setor do Calçado, entre outros temas.
P.: O CTCP, quais os domínios de atuação e competências?
R.: O Centro Tecnológico do Calçado de Portugal (CTCP) foi fundado em 1986 pela APICCAPS e dois institutos do Ministério da Economia, o IAPMEI e o INETI, a partir do Laboratório de Controlo de Qualidade criado em 1981.
O CTCP é uma infraestrutura indispensável de apoio técnico às empresas da fileira do calçado em Portugal. Para além de promover a formação técnica e tecnológica dos recursos humanos das empresas e a melhoria da qualidade dos produtos e processos industriais, o CTCP distingue-se pela dinamização do processo de inovação do setor, funcionando como interface entre empresas, universidades e entidades do sistema científico e tecnológico. Também apoia as empresas no registo de marcas e modelos e responsabiliza-se pela atividade de higiene e segurança no trabalho. Nos últimos anos a área de inovação cresceu de forma muito significativa.
E se estes serviços têm como destinatários empresas, o CTCP desenvolve ainda outras atividades com grande utilidade para o setor como a normalização e a publicação de brochuras e manuais técnicos.
O CTCP tem a sede em S. João da Madeira e uma extensão em Felgueiras, sendo estes os principais polos do calçado.
Possui infra-estruturas adequadas que dão o suporte necessário ao desenvolvimento das suas atividades, nomeadamente: Laboratório de Controlo de Qualidade acreditado; dois Shoe FabLab; dois auditórios para 130 e 220 pessoas; um Centro de Multimédia; salas de formação; salas de reunião; e gabinetes de trabalho. Atualmente, 65 pessoas trabalham no CTCP.
P.: Quais as maiores dificuldades e quais os maiores desafios?
R.: Não se pode dizer que o CTCP tenha dificuldades, mas um dos objetivos mais importantes do CTCP passa pela intervenção nas áreas da inovação. Mas sem a existência de sistemas de apoio à inovação é mais difícil aos centros investirem nesta área porque teriam de cobrir todos os custos.
Mas de uma forma geral podemos dizer que o CTCP tem sido bem-sucedido na aprovação dos seus projetos.
Desde há vários anos que o CTCP tem lançado em conjunto com diversas empresas e outros centros de investigação, projetos ambiciosos de produção de novos materiais e de novos equipamentos
P.: Acabou de falar em Inovação: A Inovação está na ordem do dia. Como a vê quando falamos do setor do Calçado?
R.: O mundo atual é caracterizado por uma grande competitividade: todos os dias surgem novas soluções que tornam obsoletas as já existentes. Mesmo em movimento há o risco de ultrapassagem por outros mais rápidos.
Apostar na inovação é por isso e antes de mais criar um estado de espírito que requer ambição e inconformismo, que procura a curiosidade e o gosto de experimentar e de mudar.
Se a inovação está na ordem do dia, conduzir uma política eficiente de inovação é complexo e exige uma intervenção articulada cobrindo diferentes áreas nomeadamente de:
- - Ciência e tecnologia,
- - Valorização e exploração comercial do conhecimento,
- - Formação e especialização de recursos humanos,
- - Proteção e licenciamento da propriedade industrial,
- - Articulação da intervenção pública (de universidades, centros de investigação, etc.) com a intervenção privada (de empresas e entidades coletivas privadas).
Ao longo dos últimos anos, a indústria portuguesa de calçado foi capaz de alterar a sua imagem junto dos consumidores e fazedores de opinião, adquirindo uma merecida notoriedade na produção de calçado de elevada qualidade, e justificar o preço médio de venda que é já o 2º mais elevado do mundo.
Esta evolução não seria possível sem que um conjunto significativo de empresas tivesse implementado processos significativos de inovação. Sucessos isolados não seriam suficientes para renovar toda uma fileira industrial.
O sucesso da fileira do calçado consolidou-se porque a inovação foi assumida por um grande número de empresas que ao longo da cadeia de valor ousaram quebrar barreiras e superar a concorrência. Foram muitas as empresas que atuando nas áreas do design e do desenvolvimento de coleções, ou no fabrico e comercialização de materiais, componentes e acessórios, ou nas diversas fases da produção de calçado, como o corte, costura e montagem, ou ainda na comercialização e venda direta aos consumidores, se tornaram empresas líder de classe mundial. Habituadas a ter que preparar várias coleções de modelos inovadores por estação, as empresas evoluíram para a produção de artigos de valor e funcionalidades técnicas acrescidas, que associaram a marcas próprias e que colocaram diretamente nos pontos de venda.
Mas não foi apenas o calçado produzido que registou grandes evoluções. Para a excelência da indústria portuguesa de calçado foram também muito importantes os investimentos em bens de equipamento e software inovadores que fizeram da indústria portuguesa de calçado a mais moderna do mundo no fabrico de calçado de couro.
P.: Qual a missão do CTCP no apoio deste tema?
R.: Como já referi o CTCP tem como missão apoiar o Cluster em áreas consideradas fundamentais, complementares e estratégicas, trabalhando sempre em estreita colaboração e parceria com as empresas, para responder às suas verdadeiras necessidades.
Para prestar este apoio, o CTCP conta uma equipa técnica especializada, qualificada e multidisciplinar, com uma larga experiência na preparação e implementação de projetos de IDT, projetos de inovação e projetos de investimento.
No âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), o Cluster do Calçado e Moda viu aprovados dois grandes projetos, o BioShoes4All e o FAIST, com um total de cerca de 100 parceiros e um investimento previsto de 140 milhões de euros. Estes projetos são considerados estratégicos e fundamentais para a modernização do Cluster e para contribuir para a transição sustentável e digital.
O BioShoes4All, projeto da Bioeconomia, estruturado em cinco pilares (Biomateriais, Calçado Ecológico, Economia Circular, Tecnologias avançadas de produção e Capacitação) tem como ambição induzir uma mudança radical nos materiais, tecnologias, processos e nos produtos de calçado e marroquinaria, contribuindo para promover a transição do Cluster para a Bioeconomia Sustentável e Circular.
O FAIST, agenda mobilizadora, por sua vez, atua principalmente no desenvolvimento de tecnologias produtivas inovadoras, ágeis, inteligentes e sustentáveis, com vista à modernização das empresas do cluster, preparando-as para responder às, cada vez mais exigentes, solicitações e necessidades do mercado.
P.: Atualmente a Sustentabilidade é palavra-chave na indústria do calçado. Que papel pode ter o CTCP neste domínio e como as empresas do cluster estão a abraçar este desafio?
R.: O Centro Tecnológico é o parceiro natural das empresas.
Seja nos domínios mais técnicos, na dinamização de trabalhos de investigação e desenvolvimento, na promoção da melhoria da qualidade dos produtos e processos industriais, ou mesmo ao nível da formação técnica e tecnológica, existindo para as empresas.
As empresas do Cluster do Calçado estão completamente alinhadas e comprometidas com a sustentabilidade, não sendo esta uma temática nova para o Cluster. O Cluster tem vindo a construir o seu caminho, com vista à implementação de modelos de negócio que combinem a sustentabilidade ambiental com a sustentabilidade financeira e social, para responder às exigências do mercado, às necessidades do planeta e aos crescentes desafios impostos pela legislação.
O Cluster do Calçado, com várias provas dadas nas últimas décadas, é exímio a transformar desafios em oportunidades, característica que o distingue e mantém na linha da frente da inovação e da competitividade. O primeiro projeto de investigação e desenvolvimento tecnológico, na área da sustentabilidade, remonta a meados dos anos 90. Desde então, muitas foram as inovações e soluções tecnológicas desenvolvidas e integradas no mercado, pela indústria, contribuindo para a distinção e reconhecimento internacional do cluster.
P.: Qual a relação do CTCP com a SANJOTEC?
R.: O CTCP e a SANJOTEC têm um publico alvo diferente.
O CTCP dedica-se exclusivamente à fileira do calçado e a SANJOTEC tem como objetivo apoiar a criação de novas empresas em qualquer setor de atividade.
Historicamente, as novas empresas de calçado têm na sua génese técnicos que já trabalham na fileira, sobretudo nas áreas da produção e do desenvolvimento de produtos. Já as empresas incubadas na SANJOTEC, e de um modo geral em qualquer incubadora, surgem através de jovens empreendedores, geralmente com formação superior, que procuram concretizar a sua ideia ou projeto de inovação, geralmente ligados a novos materiais, tecnologias da informação e comunicação, eletrónica e automação, tecnologias ambientais e tecnologias multimédia.
Não se estranha por isso que entre a SANJOTEC e o CTCP não exista uma grande carteira de projetos comuns ou uma grande cooperação entre as empresas incubadas na SANJOTEC e as empresas da fileira do calçado. Mas qualquer produto ou material desenvolvido pelas empresas da SANJOTEC, será seguramente utilizado pelas empresas da fileira, se tiver vantagens competitivas relativamente às soluções já utilizadas.
Apesar das empresas incubadas na SANJOTEC, não terem como objetivo principal, o desenvolvimento de novas soluções para a fileira do calçado, o CTCP apoiou desde o início o nascimento da SANJOTEC e integrou desde sempre os seus Órgão Sociais.
Ambos participaram também em projetos comuns financiados por programas de apoio de Portugal e da União Europeia.
A troca de informações e a visita reciproca das tecnologias instaladas em ambas as entidades constituí uma forma de difusão e transferência de tecnologia.
